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8 de março de 2007

Biografia 1961-1970



1962. Convive, em Faro, com António Barahona, António Ramos Rosa, Luísa Neto Jorge, Pité e conhece Zélia, natural da Fuzeta, que se tornará na sua segunda esposa. Estala a Crise Estudantil que Zeca segue de perto. Viaja pela Suíça, Alemanha e Suécia integrado num grupo composto por Adriano Correia de Oliveira, Durval Moreirinhas, Esmeralda Amoedo, Jorge Godinho e José Niza. É editado pela Monitor dos E.U.A. o LP “Coimbra Orfeon of Portugal”. Edita o EP “Baladas de Coimbra” com “Menino d’Oiro”.

1963. Forma-se pela Faculdade de Letras de Coimbra com a tese “Implicações Substancialistas na Filosofia Sartriana”. A 1 de Junho é decretado o divórcio de José Afonso e a primeira esposa Amália. É editado o EP “Baladas de Coimbra” com “Os Vampiros”, que é proibido pela censura.

1964. Em Maio actua na Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense. Desta experiência resultará o celebrado tema “Grândola, Vila Morena”. Parte novamente para Moçambique com Zélia e junta-se aos filhos que vivem com os avós. É editado o EP “Cantares de José Afonso”.

1965. Nasce a sua filha Joana

1966. É editado pela “Nova Realidade” o livro “Cantares José Afonso” com prefácio de Manuel Simões. Lecciona no Liceu da Beira, desenvolve actividades anti-colonialistas e começa a ter problemas com a PIDE. Escreve a música para a peça “A Excepção e a Regra” de Berthold Brecht.

1967. Regressa a Portugal e lecciona em Setúbal. José Manuel, o filho mais velho, continua em Moçambique, confiado aos avós. Tem uma crise de saúde e fica internado durante 20 dias na Casa de Saúde de Belas. É convidado a aderir ao PCP mas recusa a proposta invocando a sua condição de classe. 2ª edição do livro "Cantares José Afonso" com prefácio de Manuel Simões e recitativos de Rui Mendes. Assina contrato com a Orfeu, do qual resulta o recebimento de uma mensalidade de15 contos, contra a obrigatoriedade de gravação de um álbum por ano. Edita o LP “Baladas e Canções”.

1968. Entra em contacto com a LUAR (Liga Unitária de Acção Revolucionária) e o PCP, o que dá azo várias detenções pela PIDE. É expulso do ensino por motivos explicitamente políticos. Passa a viver de explicações e da venda dos discos. Canta cada vez com mais assiduidade nas colectividades populares. Edita o LP “Cantares do Andarilho”.

1969. Nasce o Pedro, o quarto e último filho. Participa activamente no movimento sindical. e nas acções dos estudantes de Coimbra. Em Paris participa no 1º Encontro da "Chanson Portugaise de Combat". Recebe o Prémio da Casa da Imprensa para Melhor Disco do Ano ("Cantares do Andarilho"). É publicado o livro “Cantares José Afonso” pela Associação de Estudantes do Instituto Superior Técnico, com Prefácio de Flávio Henrique Vara e que inclui 14 fotografias do moçambicano Ricardo Rangel, um texto de António Quadros (manuscrito por José Afonso) e a “Autobiografia” datada (1967) da Beira. É editado o Single “Menina dos Olhos Tristes” e o LP “Contos Velhos Rumos Novos”

1970. Edita o LP “Traz Outro Amigo Também”. Rui Pato não participa na gravação, nos Estúdios Pye em Londres, por ter estar proibido, pela PIDE/CGS, de sair do país. Recebe o Prémio da Casa da Imprensa para o Melhor Disco do Ano e o Prémio de Honra pela «alta qualidade da sua obra artística como autor e intérprete e pela decisiva influência que exerce em todo o movimento de renovação da música ligeira portuguesa». Participa no Festival Internacional de Música Popular, em Cuba.


admário costa lindo

6 de março de 2007

Pombas

Pombas brancas
Que voam altas
Riscando as sombras
Das nuvens largas
Lá vão
Pombas que não voltam

Trazem dentro
Das asas prendas
Nos bicos rosas
Nuvens desfeitas
No mar
Pombas do meu cantar

Canto apenas
Lembranças várias
Vindas das sendas
Que ninguém sabe
Onde vão
Pombas que não voltam

Menino do Bairro Negro

Olha o sol que vai nascendo
Anda ver o mar
Os meninos vão correndo
Ver o sol chegar

Menino sem condição
Irmão de todos os nus
Tira os olhos do chão
Vem ver a luz

Menino do mal trajar
Um novo dia lá vem
Só quem souber cantar
Vira também

Negro bairro Negro
Bairro Negro
Onde não há pão
Não há sossego

Menino pobre o teu lar
Queira ou não queira o papão
Há-de um dia cantar
Esta canção

Olha o sol que vai nascendo
Anda ver o mar
Os meninos vão correndo
Ver o sol chegar

Se até dá gosto cantar
Se toda a terra sorri
Quem te não há-de amar
Menino a ti

Se não é fúria a razão
Se toda a gente quiser
Um dia hás-de aprender
Haja o que houver

Negro bairro negro
Bairro negro
Onde não há pão
Não há sossego

Menino pobre o teu lar
Queira ou não queira o papão
Há-de um dia cantar
Esta canção

Canção Vai-e-Vem

Em rosa clara te vi
Rosa morta te deixei
Em rosa clara algum dia
Te verei

Na lua vinda te fiz
Lua finda te entreguei
Eras ela ou te seria
Saberei

Ai amor amores
Tenho eu mais d’um cento
Bonecas primores
Cabeças de vento

Cabeças de vento
Não as quero eu não
Ai amor amores
Do meu coração

Em noite larga te ardi
Madrugada te apaguei
No retorno que te viva
Te amarei

Em rosa clara te vi
Rosa morta te deixei
Em rosa clara algum dia
Te verei

Ai amor amores
Tenho eu mais d’um cento
Bonecas primores
Cabeças de vento

Cabeças de vento
Não as quero eu não
Ai amor amores
Do meu coração


Paulo Armando – José Afonso - refrão popular algarvio
Baladas de Coimbra ”Os Vampiros” - 1963

Vampiros

No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vêm em bandos
Com pés veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas

São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei

Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada

Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada

4 de março de 2007

Baladas de Coimbra "Os Vampiros - EP 1963




Baladas de Coimbra “Os Vampiros”
1963. Rapsódia - EP (EPF 5218)

músicos:
viola:
Rui Pato

disco 1
1 - Os Vampiros (José Afonso)
2 - Canção Vai… e Vem (Paulo Armando - José Afonso - refrão pop. algarvio/José Afonso)
3 - Menino do Bairro Negro (José Afonso)
4 - As Pombas (José Afonso/Luís Andrade)

Zeca publica a primeira canção de cariz vincadamente político. É certo e sabido que todos eles, os vampiros, sanguessugas e outros predadores hematófagos, ainda hoje estrebucham ao escutar esta canção. Mas, para mal dos seus pecados, “Os Vampiros” tornou-se um tema mais do que actual: intemporal.

Os temas “Os Vampiros” e “Menino do Bairro Negro” foram proibidos pela censura e os discos apreendidos.

Para debelar os custos de produção a Rapsódia editou outro disco em que aqueles temas aparecem em versão instrumental:

disco 2
1 - Canção Vai... e Vem (Paulo Armando - José Afonso - refrão pop. algarvio/José Afonso)
2 - As Pombas (José Afonso/Luís Andrade)
3 - Os Vampiros – instrumental
4 - Menino do Bairro Negro – instrumental

A versão original foi reeditada em 1974.


Os Vampiros
Numa viagem que fiz a Coimbra apercebi-me da inutilidade de se cantar o cor-de-rosa e o bonitinho, muito em voga nas nossas composições radiofónicas e no nosso music-hall de exportação. Se lhe déssemos uma certa dignidade e lhe atribuíssemos, pela urgência dos temas tratados, um mínimo de valor educativo, conseguiríamos talvez fabricar um novo tipo de canção cuja actualidade poderia repercutir-se no espírito narcotizado do público, molestando-lhe a consciência adormecida em vez de o distrair. Foi essa a intenção que orientou a génese de “Vampiros”, entidades destinadas ao desempenho duma função essencialmente laxante ao contrário do que poderá supor o ouvinte menos atento. A fauna hipernutrida de alguns parasitas do sangue alheio serviu de bode expiatório. Descarreguei a bílis e fiz uma canção para servir de pasto às aranhas e às moscas. Casualmente acabou-se-me o dinheiro e fiquei em Pombal com um amigo chamado Pité. A noite apanhou-nos desprevenidos e enregelados num pinhal que me lembrou o do rei e outros ambientes brr herdados do Velho Testamento.
José Afonso, in Cantares José Afonso, pp. 102-103.

Canção Vai-e-vem
O belo poema de Paulo Armando pareceu-me, como na realidade foi, inutilmente sacrificado aos compassos de uma valsa monótona e fria. Para finalizar exigia-se uma conclusão airosa; o estribilho, meio anedótico, foi colhido num livro de cancioneiro algarvio, pertencente à biblioteca da Capitania de Faro. O verso Bonecas, primores, da minha lavra, substituiu o original Bonecas de palha. O resultado, um pouco cabotino, impôs-se pela necessidade de sujeitar a letra ao primado da música.
Ibidem, p. 99.

Menino do Bairro Negro
Estilização decente de um refrão indecente recolhido numa parede cheia de sinais cabalísticos, desses que conservam para a posteridade as mais expressivas jóias dos géneros líricos nacionais. A negritude de que fala o poema existe nos estômagos diagnosticados por Josué de Castro no seu livro “Geopolítica da Fome”. Os meninos de ouro que habitavam os céus antes do Dilúvio descem à Terra e são condenados pelo tribunal de menores a viverem em habitações palafitas até ao dia do Juízo Final representado por uma bola de cartão que desce, desce até tocar nas montanhas.
Ibidem, p. 96.

Pombas
Pretendia-se que a melopeia, feita de reiterações e alongamentos em que a voz mantém as sílabas finais até se extinguir lentamente, correspondesse a um fundo independente do contexto literário e vice-versa. O poema, a melodia e o acompanhamento separam-se e reúnem-se de novo, repelidos por uma espécie de movimento ascensional sem princípio nem fim. A voz eleva-se e tenta fixar por meio de modulações adequadas o voo dos pássaros que se perde na distância.
Ibidem, p. 98.


versões do tema “Os Vampiros”

Banda da Sociedade Musical Fraternidade Operária Grandolense
Terra da Fraternidade
1999. Câmara Municipal de Grândola - CD


versões do tema “Menino do Bairro Negro”

Mariza
Fado Curvo
2003. Virgin/EMI-VC - CD

Vários Artistas
Galiza a José Afonso
interpretação de Amélia Muge
2000. Edicións do Cumio – 2CD




admário costa lindo


1 de março de 2007

Balada

Ó meu bem se tu te fores
Como dizem que te vais
Deixa-me o teu nome escrito
Numa pedrinha do cais

Quando o mê mano se foi
Sete lenços encharquei
Mai la manga da camisa
E dizem que não chorei

Meu amor vem sobre as ondas
Meu amor vem sobre o mar
Ai quem me dera morrer
Nas águas do teu olhar


Cancioneiro Popular Açoriano
Fados de Coimbra” – 1956

Aquela Moça da Aldeia

Aquela moça da aldeia
Que eu conduzi ao altar
Há-de trazer-me à ideia
Desejos de eu ir rezar

Amei-te só de me olhares
O coração adivinha
Deus fez as almas aos pares
E da tua vida a minha


António Menano
Fados de Coimbra” – 1956

Mar Largo

Ó mar largo ó mar largo
Ó mar largo sem ter fundo
Mais vale andar no mar largo
Do que nas bocas do mundo

Fosse o meu destino o teu
Ó mar largo sem ter fundo
Viver bem perto do céu
Andar bem longe do mundo


Paulo de Sá
Fados de Coimbra” – 1956

Incerteza

Não sei quem sejas que importa
Já trago a esperança perdida
Se és a luz que me alumia
Se és graça que me dás vida

Adeus palavra tão triste
Que a minha alma faz chorar
Adeus dizem os que partem
Sem esperança de voltar


Tavares de Melo
Fados de Coimbra” – 1956